quinta-feira, 31 de maio de 2012

Nota Pública sobre a morte de adolescente na “Rebelião do CASE Abreu e Lima” e o Sistema Socioeducativo em Pernambuco


O Centro Dom Helder Camara de Estudos e Ação Social (CENDHEC) vem a público manifestar sua solidariedade às famílias dos adolescentes em cumprimento de medida de internação no Centro de Atendimento Socioeducativo (CASE) Abreu e Lima, em especial, daquela que teve seu filho morto na Unidade, no último dia 28/05/12 (segunda-feira).

Da mesma forma, nos solidarizamos com aqueles trabalhadores daquela Unidade que vêm se esforçando para desenvolver um trabalho sério e, muitas vezes, também, são expostos a um ambiente de extrema violência institucional, do qual foi vítima mais um agente socioeducativo, ferido, de forma grave, nessa última rebelião.

O modelo ainda vigente em Unidades como: os CASES Abreu e Lima, Cabo de Santo Agostinho e CENIP Recife (masculino) já deram à sociedade pernambucana e do Brasil exemplos emblemáticos, nos últimos meses, de que necessitam de providências urgentes para sua transformação, a começar pela superlotação dessas Unidades, que excede mais que o dobro de sua capacidade de atendimento. Esse fato, por si só, já denunciado nos veículos de comunicação e, ainda, pelas vias institucionais, onde podemos destacar o Relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), inviabiliza qualquer tipo de trabalho socioeducativo junto aos adolescentes e jovens atendidos, constituindo-se em uma realidade que instaura um regime de tortura pela omissão do Estado.

A despeito de termos conhecimento da liberação de recursos federais para a construção de novas Unidades, nos moldes arquitetônicos do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE -, a entrega dessas tem sido protelada, passando por um processo bastante moroso, que indica a falta de prioridade política por parte do Governo do Estado para essa área.

Da mesma forma, urge o encaminhamento de certame público para o preenchimento das carreiras dos funcionários da Fundação de Atendimento Socioeducativo – FUNASE – bem como a implantação de um processo de formação continuada de seus quadros, conforme previsto no Plano Estadual de Reordenamento do Sistema Socioeducativo em Pernambuco (2010-2015), aprovado pelo Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – CEDCA/PE.

Mas, a situação é ainda mais complexa, na medida em que, também, envolve a responsabilidade dos municípios, no desenvolvimento das medidas em meio aberto (Liberdade Assistida e Prestação de Serviços à Comunidade) para os adolescentes que praticam atos infracionais, que possibilitaria um atendimento de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA -, reservando a internação ou semi-liberdade (privação de liberdade) aos casos mais graves.

A despeito da importância desse serviço de acompanhamento dos adolescentes em meio aberto, que possibilita, inclusive, maior proximidade e corresponsabilização da família e da comunidade, vem demonstrando extrema fragilidade e funcionamento inexistente em grande parte dos municípios pernambucanos.

De outro modo, também, vivemos a crise de um modelo que tende a estigmatizar, encarcerar, quando não exterminar grande parte dos jovens negros, do sexo masculino, das periferias, conforme vem apontando, seguidamente, as pesquisas do Mapa da Violência.

Essa realidade implica a responsabilidade de todo Sistema de Justiça e Segurança Pública (Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, Polícias), bem como os demais integrantes do Sistema de Garantia dos Direitos da Criança e do Adolescente - SGDCA (Conselhos Tutelares, Conselhos de Direitos, Centros de Defesa da Criança e do Adolescente...). Além disso, conforme o Art. 227, CF 88, se configura como responsabilidade compartilhada não só pelo Estado, mas pela família, comunidade e sociedade, como um todo.

Precisamos, enfim, lutar para a desconstrução dos preconceitos e conseqüente realidade de violação sistemática dos direitos infanto-juvenis, a fim de cumprir os compromissos assumidos pelo Brasil perante a comunidade internacional, quando da ratificação da Convenção Internacional dos Direitos da Criança (ONU, 1989), a fim de vigorarem os princípios do melhor interesse da criança, da prioridade absoluta, a se respeitar sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento e sujeito de direitos, que requerem, portanto, cuidados especiais.

É preciso, desde já, reverter o quadro, hoje, observado, investindo nas políticas sociais básicas, como, por exemplo: educação, saúde e moradia, a fim de garantir o respeito à dignidade humana inerente a cada um de nós e permitir a promoção da cidadania plena.

Quanto mais se retardem esses investimentos, em cumprimento da nossa Constituição Federal de 1988 e da Lei 9.069/1990 (ECA), como prioridade absoluta, continuaremos a assistir a reprodução da barbárie em nossa sociedade, com uma escalada da violência estrutural, que é fruto da desigualdade histórica que assola nosso país.

Toda essa realidade vem sendo pauta de nossas provocações enquanto Centro de Defesa da Criança e do Adolescente, parte da sociedade civil organizada, nos espaços de articulação como o Fórum Socioeducativo (Misto) e o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, os quais, vem, organizando e realizando, desde que 3 jovens foram mortos no CASE do Cabo de Santo Agostinho, em janeiro deste ano, atos públicos que denominamos de “Vigílias pelo fim da violência nas Unidades da FUNASE”.

Conclamamos a toda sociedade a engrossar esse movimento, participando ativamente da próxima Vigília, que ocorrerá no dia 19/06/2012, com concentração às 16h, na Praça da República, em frente ao Palácio do Governo do Estado de Pernambuco.

Queremos nada mais, que os recursos oriundos do desenvolvimento econômico do Estado, que vem sendo apontado como um dos maiores Produtos internos Brutos (PIB’s) do país, sejam aplicados, efetivamente, na melhoria da vida da nossa população com maior grau de vulnerabilidade (crianças e adolescentes), com vistas ao bem estar da nossa sociedade!


Recife, 31/05/2012.

Equipe do CENDHEC

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